Imaginação e Razão - Thomas Hobbes.
Imaginação e Razão em Thomas Hobbes.
Primeiramente, pretendo trazer uma
visão geral do pensamento de Hobbes para situar o leitor e facilitar a
compreensão que iremos tratar de forma mais particular no respectivo conceito
da Imaginação.
Tomás Hobbes nasceu em Westport, em
1588. Filho de um clérigo, Hobbes, em 1608, sai da Universidade de Oxford e se
torna preceptor do filho de Lord Cavendish. Por toda sua vida, ele será o amigo
devotado dos Stuart. Antes mesmo da revolução de 1648, que vai suprimir o poder
real, ele foge da Inglaterra, onde se sente ameaçado por causa de suas
convicções monarquistas. Viajará por diversos países da Europa, como pela
Itália e sobretudo pela França. Retornará à Inglaterra por ocasião da restauração
de Carlos II em 1660.
Em 1642, ele pública em Paris o livro De Cive e, em 1651, faz publicar em Londres o Leviatã ou matéria, forma e autoridade de uma comunidade eclesiástica e
civil. Hobbes é um empirista inglês e nele encontramos os temas fundamentais
que serão sempre os da escola. A origem
de todo conhecimento é a sensação, princípio original do conhecimento dos
próprios princípios: a imaginação é um agrupamento inédito de fragmentos de
sensação e a memória nada mais é do
que o reflexo de antigas sensações.
Porém, Hobbes crê na possibilidade de uma lógica pura, de um raciocínio demonstrativo muito rigoroso. Junto de uma indução empírica
aproximativa, que da
experiência passada conclui, sem prova decisiva, o que se passará amanhã. Hobbes admite a existência de
uma lógica pura, perfeitamente racional. Mas a essa lógica só concernem
símbolos, palavras. Se definirmos rigorosamente as palavras e as regras do
emprego dos signos, podemos chegar a conclusões rigorosas, isto é, idênticas
aos princípios de que partimos. Mas trata-se de um jogo do pensamento, estranho
às realidades concretas.
A filosofia de Hobbes se baseia numa
visão materialista e mecanicista. Assim como a percepção é explicada
mecanicamente a partir das excitações transmitidas pelo cérebro, assim a moral
se reduz ao interesse e à paixão.
Na visão de Hobbes, o homem se
distingue dos insetos sociais, como as abelhas e as formigas; por isso, o homem
não possui instinto social. Ele não é sociável por natureza e só o será por
acidente.
E para compreender como o homem se
resolve a criar a instituição artificial do governo, basta descrever o que se
passa no estado natural; o homem, por natureza, procura ultrapassar todos os
seus semelhantes: ele não busca apenas a satisfação de suas necessidades
naturais, mas sobretudo as alegrias da vaidade. É claro que esse estado, em que
uma procura senão a morte, ao menos a sujeição do outro, é um estado
extremamente infeliz. Assim sendo, o homem sempre tem medo de ser morto ou
escravizado e esse temor, em última instância mais poderoso do que o orgulho, é a paixão que vai dar a
palavra à razão.
É o medo, portanto, que vai obrigar
os homens a fundarem um estado social e a autoridade política. Os homens,
portanto, vão se encarregar de estabelecer a paz e a segurança. Só haverá paz
concretizável se cada um renunciar ao direito
absoluto que tem sobre todas
as coisas. Isto só será possível
se cada um abdicar de seus direitos
absolutos em favor de um soberano que, ao
herdar os direitos de todos, terá um poder
absoluto.
Não existe aí a intervenção de uma
exigência moral. Simplesmente o medo é maior do que a vaidade e os homens
concordam em transmitir todos os seus poderes a um soberano. Quanto a este
último, notemo-lo bem, ele é o senhor absoluto desde
então, mas não possui o menor compromisso em relação a seus súditos.
“O Estado de
natureza, essa guerra de todos contra todos tem por consequência o fato de nada
ser injusto. As noções de certo e errado, de justiça e de injustiça não têm
lugar nessa situação. Onde não há Poder comum, não há lei; onde não há lei, não
há injustiça: força e astúcia são virtudes cardeais na guerra. Justiça e
injustiça não pertencem à lista das faculdades naturais do Espírito ou do
Corpo; pois, nesse caso, elas
poderiam ser encontradas num homem que estivesse sozinho no mundo (como acontece com seus sentidos
ou suas paixões). Na realidade, justiça e injustiça são qualidades relativas
aos homens em sociedade,
não ao homem solitário. A mesma situação de guerra não implica na existência da propriedade... nem na distinção
entre o Meu e o Teu,
mas apenas no fato de que a cada um pertence aquilo
que for capaz de o guardar.
Eis então, e por muito tempo, a triste condição em que o homem é colocado pela
natureza com a possibilidade, é bem verdade, de sair dela, possibilidade que,
por um lado, se apoia na Paixões e, por outro, em sua Razão. ” Leviatã.
” 1.ª parte: Do Homem. Cap. XIII
Após ter já situado os principais
pensamentos de Hobbes de modo geral, podemos entrar de forma mais objetiva ao
nosso foco principal do artigo a imaginação e memória.
Para Hobbes a imaginação é o que faz
os homens moverem-se por si mesmos, são as forças internas
de um homem. É o que o torna capaz de ir além
do natural e criar algo autêntico e próprio à humanidade, logo o homem
imaginando o que for, procura de todos os modos possíveis, efeitos que podem
por essa coisa ser produzido ou, por outras palavras, pensar o que podemos
fazer com ela, quando a tivermos.
Portanto para Hobbes é essa a capacidade humanada,
a imaginação, que nos distingue dos animais. Assim, suas
próprias obras advêm da imaginação, instrumento que possibilita explicar a
realidade criada pelo próprio homem, a sociedade e o Estado. A partir desses
pressupostos, ele ergue um sistema abstrato que explica a realidade política
dos homens. É a partir desse ponto de vista que devemos considerar os conceitos
da obra, isto é, conceitos livres e carregados de capacidade explicativa e de realidade.
Junto a esse pressuposto sobre a
imaginação como motor da criação do homem e das coisas que o homem faz, Hobbes
considera uma natureza
humana estática. Diferente de Aristóteles que vê diferentes naturezas em
homens diferentes o mais poderoso tem uma natureza
superior ao mais subalterno, para Hobbes todos os homens têm a mesma natureza
e essa é imutável. O que difere um homem do outro são seus desejos
e sua imaginação.
A imaginação só é possível por conta
de nossas experiências sensíveis, tendo como principal a visão. Através dela é
possível capturarmos simulacros que permitiram a formulação de sonhos, de
pensamentos e da própria memória que armazena uma cópia não superficial de tudo
que vemos e de toda nossa experiência.
“Realmente, mesmo depois que o objeto
é apartado de nós, quando fechamos os olhos
nós continuamos a reter sua imagem, embora menos nítida do que quando a
enxergávamos. Esse é o fato a que os latinos chamavam de imaginação. ” Leviatã:
Imaginação. Cap.2. p.21.
Os gregos tinham um conceito chamado
fantasia, Phantasía (φαντασία), no grego antigo clássico, e desenvolveu-se
enquanto um conceito no seio da filosofia de Platão, no século IV a.C. Na
língua grega clássica não são poucas as ocasiões nas quais conceitos
filosóficos utilizam-se de termos comuns da língua corrente para fundar novos
significados.
“Essa
característica da filosofia grega foi legada à tradição filosófica
ocidental. No caso
de phantasía, o substantivo advém
do verbo phantazō (φαντάζω) “fazer visível” que, por sua vez, é derivado do verbo
phainō (φαίνω) “brilhar” que,
por fim, surgiu do substantivo
pháos (φάος) luz. Em uma simplificação grosseira da filosofia de Platão, podemos
dizer que, para este filósofo, todas as coisas existentes na realidade com as
quais temos contato direto através dos sentidos – tudo aquilo que podemos ver,
possuem causas. ” Artigo publicado na
edição Nº74, de setembro de 2016, Fantasia Fantástica e Filosofia, da Revista Pandora Brasil, ISSN 2175-3318.
Isso significa que, para Platão, a existência das coisas que vemos ocorre porque há uma razão para tal, as
coisas que vemos existem porque, de algum modo, surgiram de algo. Para este
filósofo, elas surgem porque existe substancialmente uma realidade superior,
acessível somente através do pensamento, imutável, eterna e necessária,
imprescindível para a existência material do mundo.
Com efeito, para que as coisas visíveis
existam, para que as
coisas materiais em geral existam,
é necessária a preexistência dessa
realidade superior.
Dito de outro modo, para que todas
as coisas no mundo existam, há necessidade da existência eterna de uma
realidade superior, que é invisível. Essas realidades superiores, para Platão,
são o que confere a existência, a verdade e a consciência, ou seja, a
capacidade de ser conhecido ao mundo.
Disso decorre que, na medida em que a verdadeira
natureza do mundo é invisível, eterna e imutável, acessível somente através do
pensamento, para conhecer o mundo precisamos conhecer as causas da realidade,
ou seja, precisamos conhecer essas realidades superiores.
Deste modo, somente podemos ter
acesso à verdade das coisas particulares através de um processo dialético cujo
ápice mediatizado é o conhecimento dessas unidades
invisíveis. Todo o resto – todas as coisas visíveis e materiais não existe
em sua verdade, mas apenas como aparência da verdade
universal e absoluta. Sendo que para Platão e para os gregos em geral, somente é visível aquilo que possui luz,
dado que mesmo que tenhamos visão e o objeto tenha cores e esteja na frente de nossos
olhos, é possível
vê-lo tão somente
pelo fato de haver luz suficiente nesse
instante.
Portanto, uma coisa torna-se visível
tão somente porque há luz, ou seja, porque brilha. Essas coisas particulares que aparecem são, assim, aparência
de verdade, ilusões comparadas com as realidades superiores invisíveis e
universais, que são as únicas substâncias que são verdadeiramente: as coisas
que aparecem são, por conseguinte, fantasia.
Como foi ditado anteriormente as
imagens capturadas pelas sensações são simulacros e são menos nítidas então
logo são sensações debilitadas, que são encontradas nos homens e em outras
criaturas vivas, tanto no sonho como no dia a dia. Portanto para Hobbes, todo
conhecimento parte dos sentidos, a origem do pensamento humano são as
sensações, logo os objetos externos pressionam os órgãos dos sentidos que em
forma de reação, movimentam-se para fora. Nesse sentido a sensação nada mais é
que a ilusão originária, causada pelo movimento das coisas exteriores em
relação aos nossos órgãos e
sentidos, agindo em nossos sentidos sensoriais.
Ou seja, a imaginação é concebida
como uma sensação diminuída, decorrente da experiência sensitiva, portanto a
imaginação é uma faculdade passiva, que se fixa em ocupar e agrupar as diversas
imagens adquiridas pelos sentidos em vários intervalos de tempo.
“Disso
depreende-se que, quanto mais longe o tempo transcorrido desde a visão
ou sensação de um objeto,
mais fraca é a imaginação. As
mudanças continuas verificadas no corpo humano destroem, com o tempo as partes
que se moveram na sensação a distância no tempo ou no espaço produzem em nós o
mesmo efeito. ” ” Leviatã: Imaginação. Cap.2. p.21.
Como já abordamos as sensações
declinantes em si chamamos de imaginação, porem quando queremos abordar o
próprio declínio, no sentido de tempo, chamamos isso de memória. Logo
imaginação e memoria são a mesma coisa, porém distintas em suas considerações e
enquadramentos. A memória copiosa é chamada por Hobbes de experiência.
É possível observar a referência
direta a imaginação das coisas percebidas pelos sentidos, sendo tanto de uma vez só como em partes
o que vai ser abordado na seguinte
modalidade:
- Memoria simples, que ocorre quando
alguém imagina algo como um cavalo que viu anteriormente e assimila a imagem dele.
- Memoria composta, que ocorre quando
fazemos uma unificação de elementos que já tivemos experiência em uma única
ocasião, logo é composta, ou seja, uma ficção
mental.
A
outro ponto em volto da imaginação que Hobbes irá chamar de Sonhos,
segundo ele a imaginação dos que dormem. Assim como as demais imaginações, foi
possibilitada anteriormente pelas experiências sensíveis. Portanto o cérebro os
nervos, são necessários pois toda a informação é processada durante o sono e
não fica ligada aos fatores externos durante esse
processo, logo podemos entender que a imaginação do sonho é gerada pelo
processo interno dos órgãos e sentidos.
Por
não ter o fator externo
para perturbações o sonho é mais nítido,
o que torna difícil distinguir
sensação do sonho, pois durante esse processo a silencio das sensações e o que
resto é a própria imaginação e o pensamento.
“A imaginação dos
que dormem constitui o que chamamos sonhos. Essa, como as demais imaginações,
foi percebida anteriormente, em sua totalidade ou em partes, pelos sentidos.
Sendo que o cérebro e os nervos, necessários as sensações, ficam em letargo
durante o sono, dificilmente se movendo pela ação dos objetos externos, dá-se
que não produzem outras imaginações, nem, por conseguinte, outros
sonhos se não o que procedem da movimentação dos órgãos
internos do corpo humano. ” Leviatã: Imaginação. Cap.2. p.23.
A relação entre imaginação e
entendimento, tem em sua afirmação material a linguagem na visão de Hobbes, ou
seja isso mostra uma valorização positiva da imaginação em relação ao intelecto
e da razão na geração de conhecimento, essa união entre intelecto e imaginação não constitui uma ruptura
com a noção de imaginação como fonte difamadora, pelo contrário, recupera a
distinção entre ambos;
ou seja algo
que Hobbes ira
pontuar como virtude intelectual a capacidade do espirito que os homens
elogiam e desejam possuir a si mesmo
e que recebem o nome de engenho,
que para ele é dividida
em dois tipos: a natural e a adquirida, logo esse engenho
natural consiste principalmente em duas coisas a
celeridade da imaginação ou seja a rapidez da passagem do pensamento para outro
e a firmeza de direção para um fim escolhido.
“A imaginação
produzida no homem (ou em qualquer outra criatura dotada da faculdade de
imaginar), por meio de palavras e outros signos voluntários, é o que geralmente
chamamos entendimento, comum nos homens e nos animais. ” Leviatã: Imaginação. Cap.2. p.23.
Sendo assim podemos notar que o
engenho natural, oriundo da experiência está relacionado a imaginação
acelerada, enquanto a imaginação lenta faz referência a estupidez. Hobbes
também faz distinção entre boa imaginação, derivada na observação das coisas pensadas
semelhantes, e do bom juízo, originado na observação das coisas pensadas
enquanto diferentes, onde é necessário aplicar o discernimento.
Já o engenho adquirido, que precede
a experiência se deriva do método da instrução, ou seja, consiste na razão, e
dessa linguagem deriva todas as ciências. Essa distinção entre engenho normal e
imaginação, assim como juízo e imaginação, gera uma importante consequência
chamada teoria do conhecimento.
Hobbes também irá tratar do que ele
chama de cadeia de pensamentos, sendo uma sucessão
de pensamento a outro que se denomina
discurso mental. Ele essa
cadeia de pensamento em dois tipos. O primeiro é livre, e inconstante, ou seja,
quando a uma meta de algum desejo ou paixão. Logo os pensamentos parecem
impertinentes uns aos outros assim como o sonho.
O segundo é mais constante por
ser regulada por algum desejo, ou seja, as vezes o homem conhece um lugar
determinado a qual ele deve procurar então seus pensamentos se fixam a procurar como se fosse varrer uma sala para encontrar
algo. Essas ideias de cadeia de
pensamentos são fixadas pela imaginação, além disso ressalva a natureza passiva
do vínculo entre a existência e a imaginação, ou seja, aproximação do desejo e
intelecto, pois a imaginação e pensamento se equivalem. Logo podemos afirmar que existe
uma natureza emocional, passiva por traz de todas as ideias e pensamentos, que
nessa sequência formam o que já foi abordado discurso mental.
Por fim podemos observar a
assimilação de conhecimento através de imagens e semelhanças a qual requer uma
associação de ideias que nem sempre é evidente, ou seja nosso conhecimento se
dá através de experiências sensíveis em forma de sequencias mesmo desorganizadas
e espalhadas, o processo de armazenagem e assimilação a trata como uma cadeia
de pensamento, ou seja um processo mental, um modelo rudimentar do
funcionamento da imaginação na mente humana, o que possibilitou de forma
positiva o engenho humano de maneira geral.
Primeiramente, pretendo trazer uma
visão geral do pensamento de Hobbes para situar o leitor e facilitar a
compreensão que iremos tratar de forma mais particular no respectivo conceito
da Imaginação.
Tomás Hobbes nasceu em Westport, em
1588. Filho de um clérigo, Hobbes, em 1608, sai da Universidade de Oxford e se
torna preceptor do filho de Lord Cavendish. Por toda sua vida, ele será o amigo
devotado dos Stuart. Antes mesmo da revolução de 1648, que vai suprimir o poder
real, ele foge da Inglaterra, onde se sente ameaçado por causa de suas
convicções monarquistas. Viajará por diversos países da Europa, como pela
Itália e sobretudo pela França. Retornará à Inglaterra por ocasião da restauração
de Carlos II em 1660.
Em 1642, ele pública em Paris o livro De Cive e, em 1651, faz publicar em Londres o Leviatã ou matéria, forma e autoridade de uma comunidade eclesiástica e
civil. Hobbes é um empirista inglês e nele encontramos os temas fundamentais
que serão sempre os da escola. A origem
de todo conhecimento é a sensação, princípio original do conhecimento dos
próprios princípios: a imaginação é um agrupamento inédito de fragmentos de
sensação e a memória nada mais é do
que o reflexo de antigas sensações.
Porém, Hobbes crê na possibilidade de uma lógica pura, de um raciocínio demonstrativo muito rigoroso. Junto de uma indução empírica
aproximativa, que da
experiência passada conclui, sem prova decisiva, o que se passará amanhã. Hobbes admite a existência de
uma lógica pura, perfeitamente racional. Mas a essa lógica só concernem
símbolos, palavras. Se definirmos rigorosamente as palavras e as regras do
emprego dos signos, podemos chegar a conclusões rigorosas, isto é, idênticas
aos princípios de que partimos. Mas trata-se de um jogo do pensamento, estranho
às realidades concretas.
A filosofia de Hobbes se baseia numa
visão materialista e mecanicista. Assim como a percepção é explicada
mecanicamente a partir das excitações transmitidas pelo cérebro, assim a moral
se reduz ao interesse e à paixão.
Na visão de Hobbes, o homem se
distingue dos insetos sociais, como as abelhas e as formigas; por isso, o homem
não possui instinto social. Ele não é sociável por natureza e só o será por
acidente.
E para compreender como o homem se
resolve a criar a instituição artificial do governo, basta descrever o que se
passa no estado natural; o homem, por natureza, procura ultrapassar todos os
seus semelhantes: ele não busca apenas a satisfação de suas necessidades
naturais, mas sobretudo as alegrias da vaidade. É claro que esse estado, em que
uma procura senão a morte, ao menos a sujeição do outro, é um estado
extremamente infeliz. Assim sendo, o homem sempre tem medo de ser morto ou
escravizado e esse temor, em última instância mais poderoso do que o orgulho, é a paixão que vai dar a
palavra à razão.
É o medo, portanto, que vai obrigar
os homens a fundarem um estado social e a autoridade política. Os homens,
portanto, vão se encarregar de estabelecer a paz e a segurança. Só haverá paz
concretizável se cada um renunciar ao direito
absoluto que tem sobre todas
as coisas. Isto só será possível
se cada um abdicar de seus direitos
absolutos em favor de um soberano que, ao
herdar os direitos de todos, terá um poder
absoluto.
Não existe aí a intervenção de uma
exigência moral. Simplesmente o medo é maior do que a vaidade e os homens
concordam em transmitir todos os seus poderes a um soberano. Quanto a este
último, notemo-lo bem, ele é o senhor absoluto desde
então, mas não possui o menor compromisso em relação a seus súditos.
“O Estado de
natureza, essa guerra de todos contra todos tem por consequência o fato de nada
ser injusto. As noções de certo e errado, de justiça e de injustiça não têm
lugar nessa situação. Onde não há Poder comum, não há lei; onde não há lei, não
há injustiça: força e astúcia são virtudes cardeais na guerra. Justiça e
injustiça não pertencem à lista das faculdades naturais do Espírito ou do
Corpo; pois, nesse caso, elas
poderiam ser encontradas num homem que estivesse sozinho no mundo (como acontece com seus sentidos
ou suas paixões). Na realidade, justiça e injustiça são qualidades relativas
aos homens em sociedade,
não ao homem solitário. A mesma situação de guerra não implica na existência da propriedade... nem na distinção
entre o Meu e o Teu,
mas apenas no fato de que a cada um pertence aquilo
que for capaz de o guardar.
Eis então, e por muito tempo, a triste condição em que o homem é colocado pela
natureza com a possibilidade, é bem verdade, de sair dela, possibilidade que,
por um lado, se apoia na Paixões e, por outro, em sua Razão. ” Leviatã.
” 1.ª parte: Do Homem. Cap. XIII
Após ter já situado os principais
pensamentos de Hobbes de modo geral, podemos entrar de forma mais objetiva ao
nosso foco principal do artigo a imaginação e memória.
Para Hobbes a imaginação é o que faz
os homens moverem-se por si mesmos, são as forças internas
de um homem. É o que o torna capaz de ir além
do natural e criar algo autêntico e próprio à humanidade, logo o homem
imaginando o que for, procura de todos os modos possíveis, efeitos que podem
por essa coisa ser produzido ou, por outras palavras, pensar o que podemos
fazer com ela, quando a tivermos.
Portanto para Hobbes é essa a capacidade humanada,
a imaginação, que nos distingue dos animais. Assim, suas
próprias obras advêm da imaginação, instrumento que possibilita explicar a
realidade criada pelo próprio homem, a sociedade e o Estado. A partir desses
pressupostos, ele ergue um sistema abstrato que explica a realidade política
dos homens. É a partir desse ponto de vista que devemos considerar os conceitos
da obra, isto é, conceitos livres e carregados de capacidade explicativa e de realidade.
Junto a esse pressuposto sobre a
imaginação como motor da criação do homem e das coisas que o homem faz, Hobbes
considera uma natureza
humana estática. Diferente de Aristóteles que vê diferentes naturezas em
homens diferentes o mais poderoso tem uma natureza
superior ao mais subalterno, para Hobbes todos os homens têm a mesma natureza
e essa é imutável. O que difere um homem do outro são seus desejos
e sua imaginação.
A imaginação só é possível por conta
de nossas experiências sensíveis, tendo como principal a visão. Através dela é
possível capturarmos simulacros que permitiram a formulação de sonhos, de
pensamentos e da própria memória que armazena uma cópia não superficial de tudo
que vemos e de toda nossa experiência.
“Realmente, mesmo depois que o objeto
é apartado de nós, quando fechamos os olhos
nós continuamos a reter sua imagem, embora menos nítida do que quando a
enxergávamos. Esse é o fato a que os latinos chamavam de imaginação. ” Leviatã:
Imaginação. Cap.2. p.21.
Os gregos tinham um conceito chamado
fantasia, Phantasía (φαντασία), no grego antigo clássico, e desenvolveu-se
enquanto um conceito no seio da filosofia de Platão, no século IV a.C. Na
língua grega clássica não são poucas as ocasiões nas quais conceitos
filosóficos utilizam-se de termos comuns da língua corrente para fundar novos
significados.
“Essa
característica da filosofia grega foi legada à tradição filosófica
ocidental. No caso
de phantasía, o substantivo advém
do verbo phantazō (φαντάζω) “fazer visível” que, por sua vez, é derivado do verbo
phainō (φαίνω) “brilhar” que,
por fim, surgiu do substantivo
pháos (φάος) luz. Em uma simplificação grosseira da filosofia de Platão, podemos
dizer que, para este filósofo, todas as coisas existentes na realidade com as
quais temos contato direto através dos sentidos – tudo aquilo que podemos ver,
possuem causas. ” Artigo publicado na
edição Nº74, de setembro de 2016, Fantasia Fantástica e Filosofia, da Revista Pandora Brasil, ISSN 2175-3318.
Isso significa que, para Platão, a existência das coisas que vemos ocorre porque há uma razão para tal, as
coisas que vemos existem porque, de algum modo, surgiram de algo. Para este
filósofo, elas surgem porque existe substancialmente uma realidade superior,
acessível somente através do pensamento, imutável, eterna e necessária,
imprescindível para a existência material do mundo.
Com efeito, para que as coisas visíveis
existam, para que as
coisas materiais em geral existam,
é necessária a preexistência dessa
realidade superior.
Dito de outro modo, para que todas
as coisas no mundo existam, há necessidade da existência eterna de uma
realidade superior, que é invisível. Essas realidades superiores, para Platão,
são o que confere a existência, a verdade e a consciência, ou seja, a
capacidade de ser conhecido ao mundo.
Disso decorre que, na medida em que a verdadeira
natureza do mundo é invisível, eterna e imutável, acessível somente através do
pensamento, para conhecer o mundo precisamos conhecer as causas da realidade,
ou seja, precisamos conhecer essas realidades superiores.
Deste modo, somente podemos ter
acesso à verdade das coisas particulares através de um processo dialético cujo
ápice mediatizado é o conhecimento dessas unidades
invisíveis. Todo o resto – todas as coisas visíveis e materiais não existe
em sua verdade, mas apenas como aparência da verdade
universal e absoluta. Sendo que para Platão e para os gregos em geral, somente é visível aquilo que possui luz,
dado que mesmo que tenhamos visão e o objeto tenha cores e esteja na frente de nossos
olhos, é possível
vê-lo tão somente
pelo fato de haver luz suficiente nesse
instante.
Portanto, uma coisa torna-se visível
tão somente porque há luz, ou seja, porque brilha. Essas coisas particulares que aparecem são, assim, aparência
de verdade, ilusões comparadas com as realidades superiores invisíveis e
universais, que são as únicas substâncias que são verdadeiramente: as coisas
que aparecem são, por conseguinte, fantasia.
Como foi ditado anteriormente as
imagens capturadas pelas sensações são simulacros e são menos nítidas então
logo são sensações debilitadas, que são encontradas nos homens e em outras
criaturas vivas, tanto no sonho como no dia a dia. Portanto para Hobbes, todo
conhecimento parte dos sentidos, a origem do pensamento humano são as
sensações, logo os objetos externos pressionam os órgãos dos sentidos que em
forma de reação, movimentam-se para fora. Nesse sentido a sensação nada mais é
que a ilusão originária, causada pelo movimento das coisas exteriores em
relação aos nossos órgãos e
sentidos, agindo em nossos sentidos sensoriais.
Ou seja, a imaginação é concebida
como uma sensação diminuída, decorrente da experiência sensitiva, portanto a
imaginação é uma faculdade passiva, que se fixa em ocupar e agrupar as diversas
imagens adquiridas pelos sentidos em vários intervalos de tempo.
“Disso
depreende-se que, quanto mais longe o tempo transcorrido desde a visão
ou sensação de um objeto,
mais fraca é a imaginação. As
mudanças continuas verificadas no corpo humano destroem, com o tempo as partes
que se moveram na sensação a distância no tempo ou no espaço produzem em nós o
mesmo efeito. ” ” Leviatã: Imaginação. Cap.2. p.21.
Como já abordamos as sensações
declinantes em si chamamos de imaginação, porem quando queremos abordar o
próprio declínio, no sentido de tempo, chamamos isso de memória. Logo
imaginação e memoria são a mesma coisa, porém distintas em suas considerações e
enquadramentos. A memória copiosa é chamada por Hobbes de experiência.
É possível observar a referência
direta a imaginação das coisas percebidas pelos sentidos, sendo tanto de uma vez só como em partes
o que vai ser abordado na seguinte
modalidade:
- Memoria simples, que ocorre quando alguém imagina algo como um cavalo que viu anteriormente e assimila a imagem dele.
- Memoria composta, que ocorre quando fazemos uma unificação de elementos que já tivemos experiência em uma única ocasião, logo é composta, ou seja, uma ficção mental.
A
outro ponto em volto da imaginação que Hobbes irá chamar de Sonhos,
segundo ele a imaginação dos que dormem. Assim como as demais imaginações, foi
possibilitada anteriormente pelas experiências sensíveis. Portanto o cérebro os
nervos, são necessários pois toda a informação é processada durante o sono e
não fica ligada aos fatores externos durante esse
processo, logo podemos entender que a imaginação do sonho é gerada pelo
processo interno dos órgãos e sentidos.
Por
não ter o fator externo
para perturbações o sonho é mais nítido,
o que torna difícil distinguir
sensação do sonho, pois durante esse processo a silencio das sensações e o que
resto é a própria imaginação e o pensamento.
“A imaginação dos
que dormem constitui o que chamamos sonhos. Essa, como as demais imaginações,
foi percebida anteriormente, em sua totalidade ou em partes, pelos sentidos.
Sendo que o cérebro e os nervos, necessários as sensações, ficam em letargo
durante o sono, dificilmente se movendo pela ação dos objetos externos, dá-se
que não produzem outras imaginações, nem, por conseguinte, outros
sonhos se não o que procedem da movimentação dos órgãos
internos do corpo humano. ” Leviatã: Imaginação. Cap.2. p.23.
A relação entre imaginação e
entendimento, tem em sua afirmação material a linguagem na visão de Hobbes, ou
seja isso mostra uma valorização positiva da imaginação em relação ao intelecto
e da razão na geração de conhecimento, essa união entre intelecto e imaginação não constitui uma ruptura
com a noção de imaginação como fonte difamadora, pelo contrário, recupera a
distinção entre ambos;
ou seja algo
que Hobbes ira
pontuar como virtude intelectual a capacidade do espirito que os homens
elogiam e desejam possuir a si mesmo
e que recebem o nome de engenho,
que para ele é dividida
em dois tipos: a natural e a adquirida, logo esse engenho
natural consiste principalmente em duas coisas a
celeridade da imaginação ou seja a rapidez da passagem do pensamento para outro
e a firmeza de direção para um fim escolhido.
“A imaginação
produzida no homem (ou em qualquer outra criatura dotada da faculdade de
imaginar), por meio de palavras e outros signos voluntários, é o que geralmente
chamamos entendimento, comum nos homens e nos animais. ” Leviatã: Imaginação. Cap.2. p.23.
Sendo assim podemos notar que o
engenho natural, oriundo da experiência está relacionado a imaginação
acelerada, enquanto a imaginação lenta faz referência a estupidez. Hobbes
também faz distinção entre boa imaginação, derivada na observação das coisas pensadas
semelhantes, e do bom juízo, originado na observação das coisas pensadas
enquanto diferentes, onde é necessário aplicar o discernimento.
Já o engenho adquirido, que precede
a experiência se deriva do método da instrução, ou seja, consiste na razão, e
dessa linguagem deriva todas as ciências. Essa distinção entre engenho normal e
imaginação, assim como juízo e imaginação, gera uma importante consequência
chamada teoria do conhecimento.
Hobbes também irá tratar do que ele
chama de cadeia de pensamentos, sendo uma sucessão
de pensamento a outro que se denomina
discurso mental. Ele essa
cadeia de pensamento em dois tipos. O primeiro é livre, e inconstante, ou seja,
quando a uma meta de algum desejo ou paixão. Logo os pensamentos parecem
impertinentes uns aos outros assim como o sonho.
O segundo é mais constante por
ser regulada por algum desejo, ou seja, as vezes o homem conhece um lugar
determinado a qual ele deve procurar então seus pensamentos se fixam a procurar como se fosse varrer uma sala para encontrar
algo. Essas ideias de cadeia de
pensamentos são fixadas pela imaginação, além disso ressalva a natureza passiva
do vínculo entre a existência e a imaginação, ou seja, aproximação do desejo e
intelecto, pois a imaginação e pensamento se equivalem. Logo podemos afirmar que existe
uma natureza emocional, passiva por traz de todas as ideias e pensamentos, que
nessa sequência formam o que já foi abordado discurso mental.
Por fim podemos observar a
assimilação de conhecimento através de imagens e semelhanças a qual requer uma
associação de ideias que nem sempre é evidente, ou seja nosso conhecimento se
dá através de experiências sensíveis em forma de sequencias mesmo desorganizadas
e espalhadas, o processo de armazenagem e assimilação a trata como uma cadeia
de pensamento, ou seja um processo mental, um modelo rudimentar do
funcionamento da imaginação na mente humana, o que possibilitou de forma
positiva o engenho humano de maneira geral.
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